Por Elainy Castro
O Maranhão apresentou uma redução de 42% no número de feminicídios no primeiro quadrimestre de 2023. Foram 19 casos registrados nos quatro primeiros meses do ano passado, enquanto, no mesmo período deste ano, o número caiu para 11, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Apesar da diminuição, o Brasil ainda tem uma longa luta contra a violência doméstica.
A redução é ainda mais expressiva considerando que, em 2022, o país bateu recorde de ocorrências relacionadas a esse tipo de crime. Foram 1.400 casos — o que significa que uma mulher foi morta a cada 6 horas. No Maranhão, o ano de 2022 como um todo registrou mais de 60 mortes em situações nas quais ser mulher foi determinante para o crime.
Quando um caso de violência contra a mulher atinge celebridades, o assunto ganha ainda mais relevância nas manchetes dos jornais. Recentemente, a apresentadora Ana Hickmann contou, em entrevista, as agressões causadas pelo marido, Alexandre Correa.
A famosa relatou que estava conversando com o filho de 10 anos na cozinha de casa, quando Alexandre chegou, ouviu a conversa e não gostou. O casal começou uma discussão acalorada e, alterado, o homem partiu para cima da modelo, ameaçando dar uma cabeçada. Na ocasião, o homem empurrou uma porta de correr contra o braço da apresentadora, que teve que ser levada à unidade de saúde.
Ana expôs que vivia uma relação tóxica, composta por xingamentos frequentes, piadas sobre sua aparência física e movimentações em seu patrimônio que a levaram a contrair altas dívidas. No entanto, sempre ouvia de pessoas próximas que tudo o que o marido fazia era para o bem da família e que ”esse era o jeito de Alexandre”, fazendo-a questionar sua própria percepção sobre a situação.
A fala da apresentadora demonstra o que acontece em milhares de lares brasileiros. Antes de culminar no crime de feminicídio, mulheres vivem rotineiramente diversos tipos de agressões e violências. Portanto, a identificação de sinais sugestivos pode ajudar a salvar a vida de muitas vítimas.
A psicóloga da Hapvida NotreDame Intermédica, Mayrla Pinheiro, explica que a violência doméstica possui um ciclo, que passa por três fases. “A primeira é a da tensão, quando ocorrem brigas e discussões. A segunda é a da agressão propriamente dita, seja física, sexual ou patrimonial. Já a última é a do arrependimento, quando o agressor convence a vítima a perdoar seus atos. Até que a situação volta a se repetir”, afirma.
Mayrla ressalta que os atos podem acontecer de formas diferentes e vão se agravando. “A violência física começa com apertões e/ou empurrões. Além disso, pode haver episódios em que o agressor arremessa objetos contra a vítima. As situações vão ficando mais graves até chegar ao ataque com arma branca ou de fogo”, explica.
Violência não é só agressão física
Além da agressão física, pode acontecer a violência psicológica, em que a própria vítima não entende o que está sofrendo, já que quem a ataca faz um jogo psíquico que coloca em dúvida a sua sanidade mental, argumentando que “ela é louca, que está fantasiando, que é desequilibrada e que não há motivos para denúncia”.
Mayrla diz que outro tipo de violência é a sexual, que ocorre sem o consentimento da vítima ou quando está sob o efeito de álcool, drogas ou desacordada, não tendo a capacidade de decidir se quer ou não. “Esse tipo de violência acontece, também, quando não permite que a mulher use o método contraceptivo que deseja, não permitindo que ela tenha autonomia para tomar suas decisões”, aponta.
A violência patrimonial é mais um exemplo de repressão. Acontece quando o agressor retém ou destrói o patrimônio da vítima. “Às vezes, a mulher trabalha o mês todo e o companheiro diz que ele é quem deve controlar as contas da casa, impedindo o acesso ao salário. Em um momento de agressividade, ele pode quebrar o celular, rasgar as roupas ou danificar objetos. Tudo isso configura violência patrimonial”, exemplifica a psicóloga.
O abuso mais comum e que, por muitas vezes, não tem a devida atenção é a violência moral. Ocorre quando há injúria, calúnia e difamação. “É muito comum ter xingamentos entre o casal e, em muitos casos, a vítima não tem nem noção do que está sofrendo porque acha uma atitude comum e rotineira. O que costuma acontecer é a repetição de um ciclo em que a vítima viu isso acontecendo na sua construção familiar, com o pai xingando a mãe, e acha que é natural, mas não é. Nós precisamos entender que isso é um ato violento e não aceitar”, destaca Mayrla.
Para a profissional, a identificação dos sinais é importante para salvar a vida da vítima, mas é fundamental que quem está de fora da situação acolha uma mulher em um momento de vulnerabilidade. “Hoje em dia temos um canal direto, que é o 180, em que é possível entrar em contato. Mas, se você foi a pessoa procurada como rede de apoio para uma mulher vítima de violência, acolha em sua totalidade, não feche os olhos e oriente a buscar ajuda profissional”, orienta.